Embrapa divulga estudo sobre tendências e novos desafios do agro com o Covid-19
O surto da epidemia da Covid-19 veio se somar aos condicionantes anteriores, passando a constituir-se em um terceiro e importante desafio ao agronegócio brasileiro. Antes do surto, as estimativas eram por um PIB Global de 2,3%. Agora se estima uma queda de até -2,5%. Uma contração mais profunda do que a crise global de 2008.
As informações são da Secretaria de Inteligência e relações Estratégicas da Embrapa (SIRE) que acaba de publicar o estudo “agronegócio em tempos de Covid-19: desafios para o Brasil e a China”, elaborado pelo pesquisador Mário Seixas Alves, do departamento de Análises e estudos Estratégicos.
A publicação tem como subsídio os dados publicados por agências internacionais que atuam com foco em agronegócio e em serviços de alimentação: RaboResearch, Food & Agribusiness, deppartamento vinculado ao Rabobank, instituição líder em serviços de financiamento para alimentação, agronegócio e sustentabilidade; FitchSolutions, pertecente à agência de risco Fitch Rating Inc., bem como pela The Economist Intelligence Unit Limited (EIU) e pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA), da ESALQ/USP.
“O Brasil enfrenta o desafio de lidar com a ameaça que a pandemia da Covid-19 representa para a saúde de seus cidadãos e para a economia do país. Como principal exportadormundial de vários produtos agrícolas, o país exerce um liderança reconhecida nos mercados globais de commodities agrícolas”, reconhece o relatório da RaboResearch, Food % Agribusiness.
Em termos globais, embora haja riscos crescentes de interrupções nas cadeias de fornecimento de alimentos, assim como de protecionismo alimentar, por parte de alguns países, estimam-se poucas mudanças na produção mundial. Isso porque a produção agrícola foi relativamente isolada da disseminação da Covid-19 e das medidas de restrições de movimentos de pessoas e de bens entre a intra-países, e regiões. “Evidências sugerem que houve uma interrupção relativamente limitada no setor agrícola, especialmentena produção de grãos e carnes”, afirma o relatório da agência FitchSolutions.
Por outro lado, o fechamento generalizado de restaurantes, hotéis e outros estabelecimentos devido à pandemia do coronavírus, tumultuou os sistemas alimentares dos dois países em foco: Brasil e China. No Brasil, a determinação de fechamentos de restaurantes, lanchonetes e outros serviços de forneceimento de alimentos diretos à população, em resposta à disseminação da Covid-19 por todo o país, reduziu a atividade de serviços de alimentação, limitando os alimentos fora da casa e apenas pedidos de entrega em domicílio, por um período ainda não determinado.
“Com grande parte da população brasileira permanecendo em casa, pelo período de isolamento social necessário para conter, ou minimizar, a contaminação pela Covid-19, a demanda por itens de consumo domésticos aumentou repentinamente e a disponibilidade de alimentos no canal de varejo se tornou uma preocupação para consumidores, processadores de alimentos e varejistas”, detalha Mário Seixas.
Sobre a produção brasileira de commodities, segundo Seixas, embora o comércio global de alimentos dê a impressão de normalidade, em meio à forte demanda de importações para a China ocorridas em março e abril, em seus relatórios analíticos, as agências internacionais demonstram preocupação com possíveis interrupções na cadeia de suprimentos em decorrência das medidas da contenão da Covid-1
“O fechamento de fronteitas ou as restrições de movimentos em determinados países, como é o caso da Argentina, pode afetar o escoamento de produção em portos para exportação”, exemplifica Seixas.
Ele acrescenta que os gargalos que podem impactar a entrega de suprimentos pelos países da América do Sul para o continente asiático podem incluir problemas com transportes terrestres, portos, restrições à circulação de mercadoria, fechamento de ativos e disponibilidade de trabalhadores.
Seixas cita alguns pontos identificados pela agência RaboResearch, Food & Agribusiness como possíveis impeditivospara o escoamento da produção para a China, tanto por países da América do Sul quanto pelos Estados Unidos: a maioria das exportações de soja e farinha da Argentina ocorre em uma pequena área perto da cidade de Rosário, que encontra-se em quarentena; o Brasil envia a maior parte de sua soja, milho e algodão pelo porto de Santos, que tem operado normalmente até agora, apesar do medo de contágio pelos trabalhadores portuários; e os Estados Unidos que enviem grande parte de sua safra de milho e soja a partir de duas regiões portuárias concentradas no Pacífico e Nova Orleans.
Mercado de carne suína
Por outro lado, de acordo com o estudo em questão, haverá um aumento de exportações de carnce suína para a China em torno de 40% em relação ao ano passado e isso deverá se manter até o ano de 2021, cenário na qual o Brasil terá grandes oportunidades de exportação para o continente asiático.
Já com relação às exportações para a China de carne bovina, as agências internacionais estimam que haja um crescimento de importações do produto dos Estados Unidos e não do Brasil, tendo em vista a questão da sustentabilidade ambiental.
Mas o Brasil já vem antecipando a este cenário: “a iniciativa da Associação Brasileira de produtores de carne Carbono-Neutro foi criada para desenvolver a oferta e a demanda por carne bovina neutra em carbono e isso deverá repercurtir lá na frente”, afirma o especialista da Embrapa em estudos estratégicos.
Também deve-se considerar neste cenário mundial a redução do poder aqusitivo da população. Como já vem acontecendo no Brasil, onde o mercado interno é responsável por cerca de 75% do consumo de carne bovina. “É o mercado exterior, retraído pela pandemia, já praticava preços inferiores desde o início deste ano”, ressalta Seixas. Ele esclarece também que em relação às propriedades dedicadas à avicultura e suinocultura, todas as instalações permanecem em funcionamento no Brasil.
Outrodado interessante é sobre a produção de açúcar e álcool no Brasil. A redução do preço do petróleo no mercado internacional provocou também a queda do valor do combustível nos postos de gasolina e afetou a competitividade do etanol brasileiro. “Muitas usinas já estãodoando etanol ao sistema píblico de saúde para a produção de álcool em gel e álcool a 70%, usados na desinfectão, devido ao excesso de produção de açúcar, em detrimento do etanol”, ressalta Seixas.
O mercado chinês de grãos
De acordo com dados da agência internacional Rabobank, a China é autossuficiente em todos os principais grãos para alimentação humana, incluindo trigo, milho e arroz. “A importação de grãos para consumo humano representa apenas uma pequena parcela do consumo doméstico, na faixa de 1% a 3%. Além disso a China possui grandes quantidades de estoque desse grãos, sob responsabilidade estatal”, explica Seixas.
Por outro lado, a China tem uma alta dependência de importação de soja. “A soja importada, a maioria proveniente do Brasil, EUA e Argentina, responde por 85% do consumo doméstico”, ressalta Seixas. “É de acordo com os dados destacados pelas agências internacionais, o mercado está extremamente preocupado com o fato de a logística interna e as operações portuárias poderem ser prejudicadas nesses principais países exportadores, especialmente no Brasil e na Argentina, o que poderia causar interrupção de fornecimento de curto prazo no mercado internacional”, complementa o pesquisador.
Mas o impacto da Covid-19 nas culturas de grãos e oleaginosas no Brasil é visto pelos especialistas das agências internacionais como limitado. Março foi o mês mais intenso da colheita de grãos de primeira safra, e início de preparo para a segunda safra. As operações de campo estão agora focados na pulverização de proteção das culturas, e essas operações estão sendo realizadas por empregados que vivem na própria propriedade. Portanto, por enquanto os problemas climáticos são vistos como principal risco para a produção.
Por outro lado, a expectativa de ganhos é grande pelos produtores, com valores nominais recordes para a soja, devido à forte desvalorização do Real, em relação ao dólar americado. Por esse motivo, os produtores estão acelerando as negociações e vendas de soja no mercado externo, em comparação com os anos anteriores.
China: mudanças no comportamento do consumidor
De acordo com a RaboResearch, Food & Agribusiness, ainda não há uma previsão de final para o surto na China, por isso, alterações profundas já podem ser observadas no comportamento do consumidor e pelas novas regulamentações criadas pelo gorverno chinês.
O governo chinês também tem sugerido que as indústrias processadoras de alimentos invistam em processos de inovação e automação, aprofundando a parceria com indústrias de tecnologias para acelerar, por exemplo, a automação de entregas com o uso de robôs ou drones, reduzindo assim os riscos de escassesz ou custos de mão de obra. “Portanto, a tendência é o aumento de comércio eletrônico, com pesado investimento ou automação para a garantia do fornecimento de alimentos para a população”, diz Seixas.
“Multinacionais hoje instaladas na China também já começam a se planejar ou a considerar a possibilidade de realocarem suas capacidades de fabricação para fora daqueles País”, ressalta o pesquisador da Embrapa.
Conheça o estudo completo sobre as tendências do agro com a Covid-19 acessando aqui.
O trabalho publicado faz parte da Série Diálagos Estratégicos – Mercados Internacionais e integra o Sistema Agropensa – Sistema de Inteligência Estratégica da Embrapa dedicado a produzir e difundir conhecimentos e informações em apoio à formulação de estratégias de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I) para a própria Empresa e Instituição parceiras.
Maria Clara Guaraldo (Mtb 5027/MG com informações técnicas do pesquisador da Sire/Embrapa, Mário Alves Seixas)
Secretaria de Inteligência e relações Estratégicas (Sire)
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